sábado, 24 de maio de 2008

Água tá Fria

Ághata, tenho uma só pergunta e depois vou embora. Por que você me odeia? Eu só queria saber quando você olhou para este meu rosto que, às vezes, chegou a ser quase bonito e decidiu dedicar todo resto de sua vida a acabar com a minha. Eu fugi das garras de teu sangue ruim, mas caí na cesta de teus frutos podres. Você não me deixou manter as ilusões, mostrou cedo demais que a vida não é boa. Você quebrou meus brinquedos, quebrou meus amigos, matou meus amores. E eu ainda nem tinha seis anos. Você tomou minhas ilusões, dizendo que eu aprendesse logo o quanto a vida é dura.
Mas a vida, apesar de você, era-me boa. Talvez isso tenha lhe ferido de morte. Eu vivia, apesar de você. Já pensou em quantas vezes poderíamos ter nos tornado diferentes? Hoje eu tenho seus brios de loucura e quase me reconheço nos rótulos dos seus remédios de faixa negra.
Esquizofrenia, depressão, distúrbios neurológicos, transtornos de ansiedade.
Você coloca todas suas culpas em mim. Eu as coloco em você. Sempre distantes, desconhecidos na mesma doença pestilenta que nos corrói deixando os nervos em frangalhos.
Eu grito, mas te entendo. Esta mesma dor, estes mesmos fantasmas, já os vi caminhar comigo. Mas fui forte, lutei e venci. És fraca, e te rendes então.
Hoje olho ao seu olho lacrado, seus hematomas e cortes. Um auto-flajelo que a deixa lacranada, com a única intenção de me ferir. Abre fissuras no teu corpo para me abri-las na alma.
Eu imagino teu choro doente, convulso de dor e de ódio, de mágoa e de pena. Sinto, porque também já chorei assim.
Ah, Ághata, querida. Talvez a pergunta seja outra: Por que você se odeia em mim?

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