quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Dane-se.

Dane-se a hora, se é cedo se é tarde
Dane-se a capa, a foto, o encarte
Dane-se o mundo, o raso, o profundo
Dane-se nada,
Dane-se tudo


Digo-te: não importa o esforço, é impossível ler o “Memorial do Convento”, do Saramago, em dois dias. A linguagem é complexa. Não pelas palavras, mas pela maneira portuguesa de formar as frases. Além disso, a pontuação em nada ajuda. Alguns parágrafos imensos são formados sem que neles apareçam pontos, só vírgulas. Não bastasse, os diálogos não tem marcação, estão imbricados no texto, adivinhe se puder de quem são aquelas palavras. Queres mais? Então tente acompanhar o fluxo narrativo. As tramas se entrelaçam umas nas outras e o irrelevante se ata mortalmente com o essencial. Não bastasse, detalhes históricos (para mim sempre chatos) são, justamente, o alvo da minha análise. Da teoria até o nome assusta: Metaficção historiográfica, simplificando: o novo romance histórico.

Apesar de tudo, o livro é riquíssimo. Tem passagens de uma criatividade impagável e é um primor de linguagem, desde que se possa absorvê-la delicadamente. Leitura apressada nenhuma dá conta de um décimo da obra toda. A quem eu estou querendo enganar então?

Não. O que me irrita não é a dificuldade de ler a obra, o que me irrita é o pouco tempo. É não poder ler Saramago como ele merece. É saber que estou fazendo mal e bem porcamente o que me propus a fazer. Em suma, Eu me irrito. O livro, confesso, é fascinante, desde que dele se possa usufruir.

O problema é que preciso dele lido todo para amanhã, e mais as teorias resenhadas. Impossível, e por isso o “dane-se”. Ainda faltam páginas e mais páginas de trama tão densa quanto o aspecto das letras. Ainda faltam teorias que se esconderam em algum lugar desse universo que habito e chamo de quarto. Ainda faltam os meus olhos não estarem incendiados de fogo. Então chega.

Sabe a vontade imensa de sentar e chorar? Ela veio. Veio porque eu não vou conseguir. Veio porque eu sou responsável com o que me comprometo e não vou conseguir. Veio porque eu me cobro demais e não vou conseguir. Não vou conseguir. Não dessa vez.

Eu tenho limites e cheguei a eles. “Faça sempre o possível. O impossível não se pode fazer”, já dizia uma grande mestra minha. Então, por fim, “Dane-se”.

Droga. Dane-se ainda mais por eu saber que vou sair daqui, tomar um banho, dois cafés e continuar tentando dar conta de tudo para amanhã. O que posso dizer? Eu sou assim. Alguém poderia me ensinar a ser fútil, irresponsável e leviano, por favor? Ser desse jeito é meu maior sonho de vida.

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