segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Textinho interpretativo

Palavras. Eu, como pseudoquaseescritor acho incrível o poder de criação delas. “Faça-se a luz e a luz se fez”. Não só a palavra escrita pode estruturar reinos, castelos e reis. Também a palavra falada é capaz de maravilhas. Minha mãe, por exemplo, não me pariu. Tampouco foi ao me adotar que ela se tornou mãe. Ela foi assim por mim criada quando eu disse pela primeira vez “mã”. Mas este texto não é para ela.

Verbos performáticos – disse Benveniste de dedo em riste – safadinhos vocês, aiaiai. E assim se deu mais uma criação, pela denominação. (E o homem só domina o que denomina, sabe?) Quando eu disse sim e você disse sim, aconteceu de alguma coisa no nosso universo mudar, se construir, explodir em criação de átomos e prótons de pura luz. Big-bang.

Mas, ah, palavras. Também de destruir elas são capazes. De quebrar, de trincar, de rachar, de matar. Só um punhadinho de vento que não se pode pegar na mão. Palavra.

— Tem dias em que é difícil te aturar.

Viu? Palavras. Textos, contextos, leituras e interpretações de Santa Ieda Linck. Se há dias em que é difícil me aturar, nos outros todos é fácil. Em todos eles, no entanto, você me atura. Eureka, tenho más novas para você. Eu não preciso ser aturado. Sabe, eu pensava que precisava ser amado, mas acho que não também. No fim o que a gente precisa é ser. Só. Estar também, mas disso eu não tenho certeza.

Um fardo precisa ser aturado. Um peso. Um incômodo. Uma sina. Um câncer. Um furúnculo. Um vizinho barulhento. Uma pena de prisão. Um barulho de construção. Um vazio. Um pesar. Um verme. Uma perna quebrada. Uma morte da vida qualquer.

Mas eu não.

Um dicionário me diz que “Aturar” é verbo transitivo. E me diz que “Aturar” vem do grego. E me diz ainda que “Aturar” é sofrer, suportar. Mesmo quando é fácil, (me) aturar é sofrer, suportar.

Eu, então, exijo teu sofrimento. Eu, então, exijo que me suportes. Oh, alma boa, faça-se livre, então, de tamanho desgosto. Desaturar, se não existe, a gente cria, inventa. Uma palavra a mais, o que custa?

Só sei que repito:  não sou pessoa que precise ser aturada. Ninguém é, aliás. Agora ature-se com isso. Durma bem com um barulho desse.

Não sou fardo, peso, incômodo, sina, câncer, furúnculo, vizinho barulhento, pena de prisão, barulho de construção, vazio, pesar, verme, perna quebrada e nem morte de vida qualquer.

Não sou.

Um comentário:

  1. Olá... Gostei muito da sua forma de usar as palavras... Vou ler tudo. Bjks de Luz...

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