quinta-feira, 18 de março de 2010

Um Rato e Três Mosqueteiros

Numa fatídica noite de algures, nos invadiu a casa a prova última da miséria: um rato. Ághata foi a primeira a vê-lo e, com seus modos particulares, classificou-o como qualquer coisa entre um ratão do banhado e uma capivara ressecada.

Eu desconfiei, ciente dos exageros da velha. Na outra noite fui eu a ver o roedor. Como eu desconfiava, era qualquer coisa pouco maior que um camundongo cinzento. Inofensivo até, quase pueril e engraçadinho.

Meu pai, em brios de mostrar serviço, catou na despensa qualquer veneno velho e, misturando com açúcar, supondo que o rato gostaria de uma morte doce, depositou a mistura letal na saleta de estar.

Na manhã seguinte os grãos cor-de-rosa haviam sido devorados todos. Ficamos com nossa ânsia assassina exultante. Havíamos matado o invasor e ainda por cima vencido a guerra.

Na mesma noite ouvimos os mesmos ruídos, o rato roendo os rabanetes do seu Raimundo, sim, porque Roma nem tem mais rei. Repetimos a operação do veneno açucarado, já desconfiados da sua eficácia.

Novamente o camundongo devorou o veneno e ainda espalhou pelo chão (como direi?) “detritos” rosadinhos. Estávamos, pois, a engordar o rato com veneno mortal.

Ah, não. Eu que não suporto ser subjugado armei de pronto uma caçada. Antes porém, é preciso adiantar: nossa indignação com o rato era tamanha porque, além dele, possuímos como bichos de enfeite, digo, de estimação, três gatos gordos. Como, por Deus, em uma casa de três gatos pode se criar um rato? É ousadia demais.

Continuando. Identificamos, pois, o possível móvel onde o ratazano (porque suspeito que é macho) estaria escondido e tramei o seguinte plano. Os gatos seriam todos transportados de suas costumeiras camas à sala, tão logo se fizesse noite. Depois, eu e meu pai puxaríamos o móvel suspeitíssimo e observaríamos (orgulhosos) o bom trabalho dos três bichanos.

Desnecessário ao relato incluir que eu já havia preparado, inclusive, um banco sob o qual trepar caso o rato planejasse violentos ataques terrestres.

Eu mesmo me encarreguei do transporte dos caçadores. Depois, conforme o planejado, puxamos o móvel e...

Francisco Alberto, vulgo Chico, 16 anos, com sua pose de Sr. Gato e investido de enorme paciência santa, foi deitando-se, em câmera lenta, no meio da sala. Onde prodigiosamente esticou-se todo de costas, apto a receber qualquer demonstração de carinho.


Jhony Henrique, o gato do meio, honrou sua enorme fama de covarde, indo esconder todos seus quilos sobressalentes debaixo de uma poltrona azul. Devidamente protegido de qualquer ação, sua maior ousadia foi espiar a sala, com olhos muito grandes e enormemente vesgos.

Victor Avalon, 6 meses, nossa maior esperança, prodígio em caçadas à borboletas e outros insetinhos voejantes, muito bem me olhou, como a dizer: “O que esperam mesmo que eu faça?” Coloquei ele atrás do móvel, prevendo a perseguição e a vitória de suas manhas felinas. Ele muito lentamente farejou tudo, atravessou encostado à parede, e foi para frente da porta, esperando a hora de poder voltar para a cama.

Em total decepção, já desistidos de nossas feras felinas, meu pai e eu, munidos de espetos e porretes nos colocamos a caçar nós mesmos a criatura vil que invadira a sala. Nem sombra do rato encontramos.

O jeito foi mesmo comprar um veneno melhor. Desde ontem não se sabe mais do rato. Certo é que meus gatos inúteis não o caçaram, bandidos que são. Talvez o veneno tenha surtido efeito. Ou talvez o camundongo tenha morrido diabético, de tanto açúcar misturado. Oxalá esteja mesmo morto... Mas alguma coisa me diz que ainda teremos notícia do vilãozinho.

5 comentários:

  1. rsrs... Me diverti muito com sua intrépida caçada. E esses gatos? Meras bolinhas de belos a enfeitar a casa, hein?

    Tive uma cadela que caçava ratos, veja você. Pegaria este ai em dois tempos.

    Boa sorte ai!

    Abraços.

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  2. Hehehehe... lá em casa é a mesma coisa! Meu gato tá mais pra moscãoteiro. Já os cachorros, esses sim, já caçaram até ratão na horta...

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  3. Eu queria ter visto essa caçada!
    Já que os tues três mosqueteiros não deram conta, da próxima vez eu te empresto os três lá de casa, sabe né, "Os Mara" não deixam passar nada.O difícil é tirar o rato da boca deles uuui que nojo hehehe
    Bjooo!

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  4. Venho muitas mais vezes do que as vezes que comento. Faço-o sempre com enorme prazer... o de ler.
    Também sou fã incondicional de gatos
    mas tenho que confessar que torço pelo roedor em causa.
    Um abraço!
    Rui V.

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  5. Já não se fazem gatos como antigamente... Ótimo conto!

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