quarta-feira, 20 de abril de 2011

De um caderno de poesia

O caderno rosa de poesias sempre foi cópia exata da menina triste. Não só o tema dos versos era íntimo diário, como a forma da letra e o estado do papel. Há letras cuidadas nos mínimos carinhos, traços delicados, redondos, levíssimos pontinhos, florezinhas nos quatro cantos do papel, borboletas de caneta e arabescos quase invisíveis de tão finos. E há, também, em outras partes, garranchos tortos de grossa caneta preta, riscos vermelhos, ranhuras, rasuras, rachaduras vermelhas no papel amassado de tanta raiva escrita. Há borrões de choro em rimas a lápis, corretivo pingado em frases fortes, páginas rasgadas por amargura pura.

E há branquidão mortal no caderno de poesias da menina triste. Achei-o ontem, por sobre as coisas de contar histórias. Estranho, intenso, depois insosso, vazio, vazio, vazio. Fui perguntar-lhe: Mas menina triste, por que essas folhas recentes tão vazias? Sabe o que é, disse-me ela, quando as folhas estão vazias demais, é porque eu também estou.

Ela falou. E eu, estranhamente, compreendi.


terça-feira, 19 de abril de 2011

Jogador

Há dias em que ele sobe todas as escadas e tranca todas as portas depois de passar por elas. É lá, do alto, que ele olha para a cidade suja. Ele fica em pé sobre a grade, desafiando o medo de não agüentar, testando o limite do gozo, antecipando o vento da morte.

Ali, quase tocando algum pedaço de céu, ele sente finalmente que tem um pouco de controle sobre as coisas. O botão de desligar ao alcance. Game over em um passo.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Uma epígrafe

“Porque você não pode voltar atrás no que vê. Você pode se recusar a ver, o tempo que quiser: até o fim de sua maldita vida, você pode recusar, sem necessidade de rever seus mitos ou movimentar-se de seu lugarzinho confortável. Mas a partir do momento em que você vê, mesmo involuntariamente, você está perdido: as coisas não voltarão a ser mais as mesmas e você próprio já não será o mesmo. O que vem depois, não se sabe.” (Caio Fernando Abreu)

quinta-feira, 7 de abril de 2011

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Como se continua a viver normalmente se em algum 
lugar há cadernos rajados de sangue?