sábado, 22 de junho de 2013

Poema


sexta-feira, 21 de junho de 2013

Conto

Você chega na sala e espera que seus alunos entrem. 
Eles correm nos corredores (justificando o nome).
Eles cospem nos que ainda estão subindo as escadas.
Eles batem nos alunos de outras turmas.
Você chama a atenção, pede, implora, perde a paciência, grita.
Eles passam por você, estão sorrindo, e dizem: “Vô no banhero!”
Você continua na porta esperando para começar sua aula.
Vem a direção trazendo mais três ou quatro e coloca para dentro da sala.
Você pede que eles sentem em seus lugares.
Uma das meninas grita sem parar: “Não vamos voltar pro lugar! Vamos sentar em meia lua! Gente, meia lua!”
Você ordena que sentem NOS LUGARES.
Eles finalmente sentam em filas. Fora dos lugares do espelho de classe.
Você procura o espelho, mas ele não está mais na sala. Eles o roubam de tempos em tempos.
Você inicia a aula e, enquanto escreve no quadro, uma das meninas está questionando as outras, em alto e bom som, se elas não sentem vontade de transar todos os dias.
É um oitavo ano.
Só metade da turma está realmente copiando.
Você chama a atenção, pede silêncio, corrige a postura de quem está deitado na cadeira, manda dois ou três abrirem o caderno, pede que, por favor, um dos alunos que está em pé sente-se no lugar.
“Já vai!”
Você pede mais uma vez que o aluno volte ao lugar.
“Já vai!”
É a terceira vez que você pede, já alterando a voz. A resposta:
“MEU DEUS, EU DISSE QUE JÁ VAI! QUE SACO! TÔ SÓ MOSTRANDO UMA COISA AQUI NO CELULAR!”
Você sabe que, se tentar tirar o aluno da sala, não vai conseguir.
Você já tentou isso antes.
Você teve que ouvir, então, que lugar de aluno é dentro da sala de aula!
Você explica o que é um texto dissertativo, a importância dele na vida estudantil, os temas cobrados em vestibulares e ENEM...
Você interrompe a explicação porque três estão conversão, quatro estão brincando e pelo menos dois estão escutando música com o fone de ouvido.
Entre protestos e palavrões (que eles sussurram), você consegue mais cinco minutos de atenção.
Você termina de explicar o que precisa que eles façam. O tema do texto é o mesmo que você e a professora de filosofia trabalharam durante todo o último mês: “O que eu tenho a ver com a corrupção”?
Alguns deles perguntam o que é “corrupção”.
Enquanto você ajuda os outros a iniciarem, uma das meninas arranca folhas do caderno sem parar. Ela as amassa e enfileira sobre a classe, formando um arsenal de bolinhas de papel. 
Você questiona o que ela está fazendo.
Ela olha pra você e sorri.
Alguns fazem suas próprias bolinhas e a guerra começa.
O texto vale 100 pontos.
Até o final da aula você vai receber 3. Da turma toda, 3 conseguirão terminar.
Você dá um basta na guerra de papel e pede que venha alguém da supervisão ou direção (não há coordenação), preferencialmente com uma câmera para registrar as dezenas de bolinhas no chão, nas classes e escondidas na mochila de uma delas.
Você espera na porta.
Um dos meninos pergunta a outro se ele “sentiu o gosto do sebinho quando chupou”. Depois diz coisas que eu me recuso a escrever. Com 25 anos eu me recuso.
Uma das meninas grita com voz patética “nãnãnãnãnão!”. Provavelmente imitando alguém.
Eu continuo tentando fazer com que eles produzam.
“Mas eu não sei o que é corrupção!”
“Corrupção é aqueles protestos que estão fazendo. O vandalismo é corrupção.”
Eu peço para que alguns meninos virem para frente. O caderno deles está em branco.
“MAS MEU DEUS! SÓ ENXERGA O CARA! AS MENINAS LÁ ATRÁS TAMBÉM NÃO TÃO FAZENDO NADA!”
Na verdade elas estão. Elas estão tirando fotos umas das outras com o celular.
Vem uma das supervisoras, estende a câmera que você pediu pela porta, sorri e some.
Você tira as fotos enquanto eles debocham e dizem:
“AAAAAAI, O QUE SERÁ QUE TEM UMAS BOLINHAS DE PAPEL?”
“MAIS CREDO! O CADERNO É MEU! EU FAÇO O QUE EU QUERO! QUERO VER SE ALGUÉM DIZ ALGUMA COISA!”
Você sai da sala. Vai à direção. Mostra a câmera, conta o horror que está a sala...
Será feita uma ata! Com a turma toda! Quando o diretor estiver na escola...
Vem um aluno de outra turma, fala com a pessoa responsável. Ele quer ir pra casa e ela não deixa. Ele sai mandando que ela vá tomar banho! Assim, gritado no saguão.
Você volta para a sala, tenta em vão parar de tremer. Sua cabeça dá voltas.
Dois alunos são tirados. A menina do questionário sobre vontades sexuais e o menino do sebinho e demais impropérios.
Os outros querem saber por que eles foram tirados.
“DAÍ SIM! ELES NÃO FIZEREM NADA!”
Sobre as bolinhas de papel, as fotos serão mostradas aos pais.
“Grande coisa! Minha mãe tem muito mais o que fazer do que vim aqui vê foto de bolinha.”
“Verdade, fulana, ela vai vim aqui, puxar um cigarrinho e fumar enquanto eles falam.”
Risos ecoam.
“O que adianta? Eu já fui até pro conselho e não deu nada. Tinha que ver que legal! A muié lá falando, falando, falando e eu mexendo no celular. Ela falava da escola e eu contava das festa que eu vou.”
“Quem aqui já foi pro conselho?”
Mãos se erguem.
“Dá nada, né?!”
“Ah, é chaves...”
Você tira as dúvidas dos três ou quatro que estão fazendo a dissertação. Dois deles querem saber se é pra fazer sobre o mensalão.
Um dos alunos traz um papel com um texto escrito em vermelho, azul e verde. De cada linha ele ocupou a metade, para que rendesse. Você lê a primeira linha:
“A corrupção no brazil contra o almento de coisas no Brazil as coisas aqui estão muito cara e as que são pobres estão passando fome”
Você para. Há um ponto no texto inteiro. E quatro vírgulas.
É um oitavo ano.
Você diz que não aceitará o trabalho e tenta apontar os problemas. Ele interrompe, tomando o texto e indo sentar.
“MAS NÃO ACEITAM NADA! SE A GENTE NÃO FAIZ, RECLAMAM, SE A GENTE FAIZ, RECLAMAM TAMBÉM! NÃO SEI O QUE FAZÊ PRA AGRADÁ ESSA GENTE!”
Provavelmente será determinado que ele passe no final do ano. Já foi assim até aqui.
Você pensa na perspectiva de estar na formatura dele. De ouvir os pais deixando uma mensagem especial sobre a dedicação, o empenho e as vitórias dele...
Você já ouviu isso antes.
É 11h26min e aqueles que não fizeram nada a aula inteira guardam o material.
O horário de saída é 11h40min.
Você ordena que eles sentem, que façam o texto, lembra a eles que vale 100 pontos, que será uma das avaliações... Eles abrem a porta e saem para o corredor, começam a gritar com uma turma que já está lá fora gritando, correndo e se batendo. São do Mais Educação, provavelmente.
Uma das meninas vira pra você, depois da aula inteira, e pergunta:
“Tá, é pra fazê um poema?”
Você fecha os olhos e espera que o sinal bata de uma vez.

quarta-feira, 19 de junho de 2013

Engano

De repente, tu chegas para a festa e não te querem. Tu insistes, bates uma vez mais na porta, o som é alto, quem sabe não ouviram.... Nada. A ti parece que alguém espiou pelo olho mágico... e não abriu.

Tu ligas ao dono da festa. Ele não atende. Deixas uma mensagem, polida, hesitante e meio alegre, avisando que está ali e que alguma confusão houve... Ninguém responde. Tu gritas um nome ou dois para a porta... Alguém abre, finalmente.

Abre e avisa com todas as letras: não, não te querem na festa.

Tu desces as escadas, então, cabisbaixo... Tu tentas, em vão, te convencer de que, afinal, a festa nem era tão importante... Soa irremediavelmente como o consolo da raposa "estavam verdes as uvas". É mentira. A festa te importa, te importa a alegria dos que estão lá, bebendo, dançando, sorrindo, batendo uns nas costas dos outros, brindando.

Na janela, tu vês as luzes coloridas se derramando. Alguém aponta para ti lá de cima e ri, ri, ri. Tu, que te julgavas tão importante, tão maior, tão dono da festa toda, atravessa a rua desolado. Não há mais para onde queiras ir. Não há festa, por maior ou mais bela, que te console agora. Não há caminho, não há graça.

Tu tentas compreender o porquê de não te quererem ali. Pensas no que disseste, no que fizeste, no que deixaste por dizer... Nada te ocorre. Nada que justifique. Talvez tu simplesmente não pertenças àquele lugar. Tentas, mais uma vez, te convencer: é isso, tu és bom demais para aquele lugar! De novo as uvas soam verdes.

É tua incompetência a causa do ostracismo... É a falta em ti do que eles têm. E o que é? Tu não sabes dizer. Continuas o caminho, olhando para trás volta e meia, checando o celular.... Quem sabe tudo não passou de um engano... Quem sabe alguém acene da janela ainda, chamando-te de volta... Quem sabe o dono da festa ligue e esclareça as coisas...

Quem sabe não.

É, pensas por fim, foi tudo um engano... A vida toda até aqui. E então desistes das festas todas.

quarta-feira, 12 de junho de 2013

Namoro

Namorar não é mudar status de Facebook, ir a jantares caros e ligar toda hora para a pessoa. Namorar não é comprar um presente pra impressionar, gastar o que não tem em uma lingerie para a noite e escrever com letra bem bordada “Eu te amo” em cartão.

Namorar é tão delicado quanto o amor. Tão sutil quanto ele.

Namorar é sentir o perfume do outro, até estando longe. É querer jantar todos os dias com aquela pessoa, mesmo que seja só um pão com mortadela. É ficar em silêncio, só olhando o rosto de quem se ama, ou então conversar madrugada adentro, sem perder o tom. Namorar é ver, sem dia marcado, algo que o outro gostaria muito e comprá-lo, por singelo que seja, não para impressionar, só para fazer sorrir.

Namorar é conhecer as alergias e manias de quem se namora. É entender olhar. É ter música certa. É saber o que o outro vai dizer antes mesmo que o diga. Namorar é ter para quem sorrir.

Namorar é ficar esperando na janela. É não ter vergonha de chorar, de se revelar fraco, de pedir ajuda. Namorar é tirar sarro, é corrigir e é falar sério sem que isso gere uma grande tempestade. Namorar é dizer “você está errada!” tanto quanto “você é linda!”. Namorar é mandar mensagem para que ela não se esqueça de lhe trazer seu remédio. É saber que ela gosta da sensação de passar uma pena pelo rosto. É olhar com um sorriso a pulseira que ela esqueceu na sua casa. É escrever declarações em cadernos antigos. Namorar é escolher o nome dos filhos.

Namorar não é coisa para se comemorar em um dia específico. É coisa para se construir no dia a dia. Amor não é algo para mostrar. É algo para aninhar no peito. 

O amor não é aquilo que aparece nos presentes, nos status, nas lingeries vermelhas. O amor é aquilo que se esconde no brilho do olho de quem namora, quem namora de verdade.