sábado, 25 de outubro de 2008

Texto em branco

"Bico calado, muito cuidado, que o homem vem aí"

Eu preciso do direito ao silêncio, tanto ou mais que do direito ao grito. Porque o silêncio é marca maior que a palavra. Diz mais em seus sussurros de vento do que ousaríamos.

Quero o sabor de um texto tranqüilo, mudo, todo silêncio. Preciso da promessa que cala.
Todas as artes usam o silêncio dramático. Nos quadros o branco, nos palcos o mudo, nas músicas as paradas, nos poemas o espaço.
Silêncio.
Meus poemas sempre foram corridos, meus textos escorrem cheios de burburinhos. Alminhas pequenas e corroídas correm, pulam, sapateiam e falam à minha volta. Minha mudez é impossível, ao meu silêncio não há espaço, minha tranqüilidade me é negada.
Eu queria dizer tanto neste espaço vazio. Mas falta a habilidade de escrever sem palavras. Até as entrelinhas eu consigo preencher.
Carrego o papel de tintas rikins. Pobre papel, quem o dera ser branco. Quem me dera receber cartas brancas em envelopes pardos, via correio, via malote, voam os pombos, sempre cinzas, nunca brancos.
Sonhos brandos? Quem me dera. Tão agressivos os dias, os sonhos e essa metralhadora máquina de escrever.
Tec, tec, tec. Um som para cada letra.
Tec, tec, tec, Um som para cada pingo.
Chove.
Chove nas casas, chove nas ruas, chove nos carros que passam, nem a Deus o direito de nos dar o silêncio.
Há sempre um barulho existencial, tudo que existe ressoa com uma total falta de escrúpulos.
Silencie o mundo todo e ainda ouvirá sua respiração, seu coração batendo. Nem a morte é silêncio. Cadáveres também falam, cada vez mais.
E o que chamam de caos, a imaterialidade total, o antepassado de tudo que existe, seria ele um velho silencioso?
Foi então que ouve a explosão, o barulho da explosão e nada mais ficou quieto. Queria inundar os meus textos na mudez patética em que fico algumas vezes, antes de viver. O menino que tudo olha e pouco vê.
E o futuro não muda, apenas as cartas de vê-lo é que emudecem. Talvez vergonha de estarem sempre erradas, de fazerem suas boas promessas tolas.
Tec, tec, tec. Um som para cada segundo.
E eu o que fiz destas horas?
Reticências.

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