quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Por nós

Anoitece. Músicas novas preenchem meus vitrais de silêncio. Estou só e não sei ficar assim. Acompanhado sei ficar menos ainda, é verdade, mas com o só eu já me acostumei. Se alguém viesse, se alguém batesse à porta, eu abriria e chamaria para entrar.

(Mentira. Eu trancaria as portas e me esconderia por detrás das cortinas.)

Se alguém viesse, eu serviria café passado – se houvesse filtro. (E filtro não há.) Mas não importa. Ninguém vem. Eu pareço – de fora – fortaleza. Não dou abertura? Eu assusto? E vocês têm medo? Medo de escrever errado – eu não ligo. Medo de ser banal – eu até gosto. Medo de incomodar – mas e se eu preciso?

Vocês têm o medo de quem vai salvar alguém de afogamento, eu sei. Vocês têm medo de se afogarem comigo. Mas sou raso. No fundo, no fundo sou raso. Só não contem que ouviram isso de mim.

Sei falar da lua (e seus mistérios), sei falar da bebida (e seus espíritos de vinho), sei falar da vida alheia (e sua insondabilidade)... Sou mesmo de matar! Entre parênteses eu sou de matar. Eu tento ser fácil, juro, mas preciso de ajuda. Da ajuda do afogado. Preciso do abraço que naufraga. Como, então? Não sei. Não sei e não me deixam descobrir, ilhado que sou.

Mas se vocês viessem eu serviria biscoitos. (Eu tentaria evitar os amanteigados, juro. Eu seria simples, se vocês viessem: bolachas de água e sal. Pode ser? Não pode, né?! Eu já os perdi no café, confessem. Vocês bebem chimarrão. Vocês bebem cerveja. Mas eu não. É por isso?) Eu ouviria essas músicas aí de vocês. Eu desligaria essas minhas, em francês. Eu não cantaria rien de rien, se vocês viessem.

Mas vocês não vêm. Vem a noite, vêm as estrelas, a lua vem. Vem a ironia e os mosquitos também. A madrugada vira dia, o tempo vira a página, o carteiro vira a esquina. Mas não vem. Toca o telefone: é engano. Chega um e-mail: é propaganda. Vem alguém...

Mas não, moço, eu não quero um balde de pêssegos sem caroço.

Eu quero um é 'vocês' para deixar de ser tão eu.

2 comentários:

  1. Creio que todas as fortalezas se sentem assim...Gostei muito de ler!

    Abraço,
    Isa Lisboa
    http://instantaneospretobranco.blogspot.pt/

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  2. E qual é exatamente este limite...entre o eu e o próximo...

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