Chamaram-me eles à sala de vidro, onde não se que estar. A moça sorridente, vestindo verde por trás do balcão, estendeu a mim o papel e disse mais ou menos assim:
— Aqui está a sua passagem.
Eu pedi a passagem, mas da primeira vez ela não veio. Então eu pedi novamente, aí me entregaram. Ao recebê-la não soube ao certo o que fazer. Há os que por ela choram, rejeitam-na. Por querê-la, deveria me alegrar. Mas era coisa de entristecer, dizia assim a formalidade convencionada. A moça, depois de minha pausa dramática, prosseguiu:
— O senhor embarca no dia 17 de abril.
Titubeei. Uma coisa é querer, oposto é ter. Eu queria a passagem como sonho remoto, agora ela era concreta, papel nas mãos, suor nas mãos. Nervosismo de ver realizado um sonho sobre o qual não se tem mais muita certeza. Os antigos mandavam tomar cuidado com o que se deseja, agora entendi. Entendendo indaguei, depois de engolir o medo:
— Desculpe, moça, mas qual é mesmo o destino?
— Sinto não poder informar.
Ela disse sorrindo, como se fosse natural dar uma passagem para destino incógnito.
— E a volta?
— Então o senhor não vê? É uma passagem só de ida.
— Para lugar desconhecido?
— Exato.
— Mas isso pode ser qualquer lugar...
— Isso mesmo. Acabo de lhe entregar sua passagem para qualquer lugar, do Inferno ao Paraíso.
Do inferno ao paraíso. As mãos tremeram. Pensei no purgatório, é ele que há entre o inferno e o paraíso. Mas aí notei que era metafórico. Desistir da viagem seria covardia, como foi covardia pedir a passagem para fugir daqui. Entre um score de uma ou duas covardias, optei pelo primeiro. Ficaria somente com uma na cota, justificável. Além disso, disse a todos que eu sairia dali, não podia desapontá-los, sou homem de uma só palavra.
— Se o senhor desejar pode embarcar antes do dia 17, mas daí poderá levar somente uma parte da bagagem.
Não parecia uma boa opção.
— A data está ótima.
Quanta apreensão até lá, quanta angústia e quanta noite sem dormir. Serão dias e mais dias, horas e mais horas, sabendo que o desconhecido me espera abaixo da torre de rico marfim.
Na hora penso em minhas caras cartas de adivinhar, penso em perguntar a elas para onde vou, mas elas já nem falam mais comigo. A moça fala:
— Posso ajudar em mais alguma coisa?
— Não, obrigado.
Agradeço e saio, sem nem quebrar os vidros.
— Aqui está a sua passagem.
Eu pedi a passagem, mas da primeira vez ela não veio. Então eu pedi novamente, aí me entregaram. Ao recebê-la não soube ao certo o que fazer. Há os que por ela choram, rejeitam-na. Por querê-la, deveria me alegrar. Mas era coisa de entristecer, dizia assim a formalidade convencionada. A moça, depois de minha pausa dramática, prosseguiu:
— O senhor embarca no dia 17 de abril.
Titubeei. Uma coisa é querer, oposto é ter. Eu queria a passagem como sonho remoto, agora ela era concreta, papel nas mãos, suor nas mãos. Nervosismo de ver realizado um sonho sobre o qual não se tem mais muita certeza. Os antigos mandavam tomar cuidado com o que se deseja, agora entendi. Entendendo indaguei, depois de engolir o medo:
— Desculpe, moça, mas qual é mesmo o destino?
— Sinto não poder informar.
Ela disse sorrindo, como se fosse natural dar uma passagem para destino incógnito.
— E a volta?
— Então o senhor não vê? É uma passagem só de ida.
— Para lugar desconhecido?
— Exato.
— Mas isso pode ser qualquer lugar...
— Isso mesmo. Acabo de lhe entregar sua passagem para qualquer lugar, do Inferno ao Paraíso.
Do inferno ao paraíso. As mãos tremeram. Pensei no purgatório, é ele que há entre o inferno e o paraíso. Mas aí notei que era metafórico. Desistir da viagem seria covardia, como foi covardia pedir a passagem para fugir daqui. Entre um score de uma ou duas covardias, optei pelo primeiro. Ficaria somente com uma na cota, justificável. Além disso, disse a todos que eu sairia dali, não podia desapontá-los, sou homem de uma só palavra.
— Se o senhor desejar pode embarcar antes do dia 17, mas daí poderá levar somente uma parte da bagagem.
Não parecia uma boa opção.
— A data está ótima.
Quanta apreensão até lá, quanta angústia e quanta noite sem dormir. Serão dias e mais dias, horas e mais horas, sabendo que o desconhecido me espera abaixo da torre de rico marfim.
Na hora penso em minhas caras cartas de adivinhar, penso em perguntar a elas para onde vou, mas elas já nem falam mais comigo. A moça fala:
— Posso ajudar em mais alguma coisa?
— Não, obrigado.
Agradeço e saio, sem nem quebrar os vidros.
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