quinta-feira, 21 de junho de 2012

Mirror, mirror

Comigo os espelhos não falam. Nenhum deles. E olhe que de alguns sou bem íntimo, tendo convivido com eles desde criancinha.

 Meus espelhos triplos só fazem é me observar. São mudos. E reflexivos, os coitados. Ainda assim, às vezes vejo neles qualquer olhar acusador. Como se estivessem prestes a me falar... Prestes a dizer coisas que eu não gostaria nem um pouco de ouvir.

Mas na hora H calam-se.

São meus e parecidos demais comigo estes espelhos quietos e observadores.

Além disso, eu tenho sempre coisas duras demais nas mãos. Uma xícara, um peso de papel, um grampeador, um vidro do século XVI...

Talvez é pelo medo de quebrar que não me falam os espelhos mudos.

Eles me diriam coisas horríveis, apontariam para mim minhas próprias falhas. Minhas covardias, minha falta tremenda de nudez, minhas mudanças para pior, meus apodrecimentos precoces, minhas nuvens negras e minhas maldições mais obscuras.

Quietos! Grito eu. E é só meu grito que se escuta pelo quarto.

Quietos, repito aos sussurros, pronto para atirar-lhes qualquer coisa.

Por um instante ouço o vidro partindo. Vejo as lascas grandes, os estilhaços, os cacos se derramando sobre livros e papéis e caixas, inúmeras caixas. No que sobrou da moldura eu vejo ainda meu rosto, partido, quebrado, mais real do que nunca.

Mas não, eu não atirei o que tinha na mão. Não, eles não se quebraram. Não, eles não falaram, não fizeram um gesto sequer. Porque eu também não o fiz. Estamos seguros. Os espelhos e eu.

Deixo que o vidro grosso do meu perfume caia no chão. E quando faço isso, o espelho me sorri de volta. Desprezível. Como que para dizer que sabia, o tempo todo, que eu não teria tanta coragem assim.

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