segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

O jogo

Como se entrassem pela minha porta e me entregassem as peças e o tabuleiro de vidro. E me explicassem então todas as regras. Como se eu compreendesse o objetivo do jogo e decidisse arriscá-lo. Como se eu fosse movendo, peça por peça, para criar o preciso desenlace. Como se eu já houvesse traçado todos os movimentos das próximas todas jogadas. Como se em mais alguns lances eu fosse vencer.

Como se voltassem pela minha porta e me dissessem para parar com tudo. Como se me contassem que as regras todas que agora valem são novas. Como se me deixassem com o mesmo tabuleiro, as mesmas peças, a mesma posição, tudo congelado no espaço e dissessem: “Quando recomeçar o objetivo do jogo é outro: o Rei não vale mais nada, é a peça de menor valor. Já a Torre deve ser protegida a qualquer custo, inclusive a custo do Rei”.

Como se as novas regras eu não entendesse direito. Como se não me houvessem explicado qual o lugar dos meus movimentos anteriores. Como se não me houvessem dito qual era o novo caminho. Quando meus objetivos, quando meus sonhos, quando o próximo passo? Não haveria próximo passo? Como se todo meu tabuleiro – antes vencedor – estivesse agora em posição ruim. Mal orientado, deselegante, pronto para perder em dois ou três lances.

Como se de repente eu tivesse que me reinventar, caso quisesse continuar tendo sentido. Como se antes, nas regras claras, meu sentido fosse explicado por si só. E agora eu precisasse, desesperadamente, encontrar um novo. Como se eu precisasse retraçar metas, objetivos, planos. Como se eu precisasse rever o valor de todas as peças. O Peão, o Bispo. O Cavalo. A Rainha.

Como se eu precisasse fazer da minha quase vitória um novo jogo, no qual a desvantagem já seria o ponto de partida. Como se eu decidisse fazer. E como se a partir daquele momento tudo mudasse.

E mudou.

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