quinta-feira, 9 de abril de 2009

Chamada perdida

"Vou desligar, não me ligue mais. A obrigação da tua voz é estar aqui."

Primeiro você olha no celular, mas não tem nenhuma chamada perdida. Daí você espera ele ligar. Por que você não pode ligar para ele? Porque é ele quem deve ligar para provar que pensou em você.
Ele não liga.
Então, você espera mais um pouco, que é para ter certeza de que ele não vai ligar. Olha de novo no celular, de repente pode estar com defeito. Minutos depois, você já se põe a inventar desculpas pela falta da chamada. Talvez ele esteja em uma reunião, quem sabe sofreu um acidente, quiçá tenha sido abduzido por extraterrestres.
Você tenta ligar de um outro número para o seu celular, só para garantir que não está com defeito. A música toca. Ok, o aparelho está em perfeitas condições de receber chamadas. Aí então você pensa “vou ir tomar um banho, quem sabe esqueço”. Não esquece, porque você já está sem roupa quando percebe que deixou o celular no quarto. Volta buscar porque ele pode querer ligar justo nesta hora.
O banho termina e você seca os cabelos demoradamente.
E se o telefone tocou e você não ouviu por causa do barulho do secador? Verifica as ligações perdidas, nenhuma.
“Vou ligar”, você pensa. Então manda o orgulho às cucuias e procura o nome dele na agenda.
Primeiro toque.
“O que vou dizer?” No mínimo deve estar na casa daquele amigo. Sim, porque ele precisa ir na casa do amigo TODOS os dias, sempre com uma desculpa diferente.
Segundo toque.
Se fosse você, ah se fosse você a ir TODOS os dias (exceto domingos, é verdade), na casa de uma amiga, meu Deus, o barraco estaria feito.
Terceiro toque.
Será que ele ainda não entendeu que você se sente em segundo plano quando ele faz isso? Se ele estiver lá, você desliga na cara.
Quarto toque.
E se não estiver? Por que ele ainda não ligou?
Você começa a pensar que não deveria ter feito isso.
Quinto toque.
Será que o celular dele está no silencioso?
Ou quem sabe perdeu, ou foi roubado...
Sua chamada está sendo encaminhada para a caixa de mensagens...
Você desliga o telefone. Ele não atendeu. Você não acredita, mas ele não atendeu.
O sangue ferve, desferve e nada do celular tocar de volta. Você não vai insistir, afinal, onde está sua dignidade?
Mas... e se de repente se você mandasse uma mensagem... Mas que mensagem? “Onde você está?” Será que transmite bem nas entrelinhas o que você está sentindo? Não, nem chega perto. Que tal “Você ainda lembra que tem namorada?” Muito duro. Ele pode se magoar.
Ele pode se magoar? E você? Como você está se sentindo?
Respire fundo agora. Talvez você esteja fazendo tempestade em copo d’água.
Tudo bem que ele ainda não deu sinais de vida. Tudo bem que já tenham se passado mais de duas horas. Tudo bem que no mínimo está com o mesmo amigo de SEMPRE. Tudo bem que tenha esquecido que você existe e provavelmente nem vá lembrar até ver sua ligação. São só mais de duas horas em que você não consegue pensar em outra coisa. Duas horas de angústia e aflição. O motivo é besta, não? Não quando é com você que isso acontece.
Besta, é assim que ele diria se soubesse do que você sente agora. Ele diria que sua atitude é besta, infantil, imatura e só reflete sua insegurança.
Mas e se fosse o contrário?
Você lembra das vezes em que ele telefonou e você estava na casa ou no trabalho daquela sua amiga? Você lembra o tom de reprovação? Você lembra da cara amarrada no outro dia?
Então... Se fosse o contrário?
Se fosse ele a estar se sentindo sempre de lado? Se fosse ele tentando ligar para alguém que não atende? E se fosse ele, meu Deus?
Talvez precise ser.

2 comentários:

  1. A vida era melhor sem esse aparelho satânico chamado celular, "tamagóchi" para adultos. Por isso que deixo o meu sempre em casa e sem créditos.

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  2. Às vezes é um excesso indiscreto, que suga os neurônios, por completo, alheios de uma ilusão perfeita - sim, sempre.

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