segunda-feira, 3 de novembro de 2008

A Carta Suspensa*

"Hoje estou afim de enlouquecer"



Acalmem-se, danadas, calem-se todas!
O que eu mais queria era poder colocar todas vocês em ordem.
Sentar-me ao trono de rei e chamar à audiência uma de cada vez. Então eu poderia ouvi-las com calma, até que a que fala, não tenha mais nada para me dizer. Só daí, passar para a próxima. Queria esmiuçar uma a uma de vocês, chegar ao âmago de cada questão, decifrá-las inteiras, satisfazê-las.
Mas vocês, heim, tão desordenadas e bagunceiras...
Preferem correr à minha volta, cada uma com um grito, puxando a barra pisada da minha calça jeans.
Fazem tumulto, algazarra, se atropelam, se engatam, engatilham, um terror... um terror...
E eu fico aqui perdido.
Enquanto estou no meio de uma já vem outra, implorando urgência. Largo aquela, socorro esta, caio nas graças de alguma outra...
E ao fim, nenhuma.
Ninguém lhes ensinou? Tenham paciência, ora.
Eu não queria mais esta responsabilidade sobre vocês, juro.
Por mim, jogava metade do que eu sei no lixo. Talvez assim vocês cansassem e fossem importunar algum outro.
Vocês não me deixam dormir, não me deixam comer, até quando ando na rua, vocês me vêm à cabeça, desgraça. Estes cabelos brancos, quem vocês acham que causa? Algumas de vocês são sem noção, tantas outras sem fundamento, todas andam me deixando sem vontade.
E quando as chamo? Quando preciso, de uma só, que seja... Vocês vêm? Não, imagine...
É só perceberem que estou a procurar, pronto, escondem-se todas no meio do jardim.
E eu chamo, clamo, reclamo, imploro e nada. Até ouço os risinhos abafados na grama, malditinhas.
Mas é só eu desistir que lá vêm vocês, às centenas, me trazendo encrencas, desilusões, machucaduras e arranhões.
Cansei.
Se pudesse me livrava de cada uma de vocês, mas fazendo isso, sou eu quem deixo de existir.
Tudo bem, tudo bem, não sumam, meninas. Apenas, por favor, tentem manter um mínimo de ordem dentro da minha cabeça. Sabem aquele mínimo necessário para não ir parar no hospício? Pois é.

* Sobre o título:
Uma delas sugeriu "Às idéias, com amor".
Outra preferiu "Às idéias, com rancor".
A terceira mandou que as outras duas ficassem quietas. Era preciso, pois, criar suspense.
A quarta leu suspensa no lugar de suspense, na frase anterior.
Todas riram e uma quinta opinou: Por que não põe "A carta suspensa"?
Eu tentei dizer que não fazia sentido, mas elas me olharam com uma faca na mão.
Então tá, seja feita a nossa vontade....

2 comentários:

  1. ah... uma saudável esquizofrenia de todos nós.
    Adorei seu blog, obrigada pela visita lá.

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  2. Loucura, loucura, loucura.!
    aí, ficou muito bom, parabéns.! ;D

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