terça-feira, 8 de setembro de 2009

Corvo-correio

Ághata voa pela casa, espalhando nos cômodos as tragédias do além. Ela grasna de cidades destruídas pelas pedras do céu. Quando sai pela janela, voa buscar notícias, só as de desgraça e morte. Volta afoita, quase feliz, penas arrepiadas e cadáveres no bico. Daqui, ela conta coisas que não aconteceram, tentando fazer qualquer flagelo parecer maior.

Ághata espalha no meu ar o cheiro ocre de carniça. Porque ela quase se rejubila com o pranto alheio. Bem, na verdade, deleita-se toda, mas dis-far-ça-da-men-te. Sua alegria tem máscara: solidariedade. Não é. É puro gozo porque isso comprova sua tese. Isso fortifica sua crença. Isso aumenta sua fé na decadência. Porque tudo é decadência, doença, desgraça e morte. O mundo é maravilhosamente cruel e diabólico. Ela goza farta, porque Deus...

... ah, Deus é deliciosamente mau.

2 comentários:

  1. E ela, sem saber, ao tentar modificar uma música, confere timbres que já eram esperados, quando da composição... (um quê de tolkien....)

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  2. Hmmm... Sim, concordo... A ironia tem um sabor delicioso.

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