sábado, 10 de setembro de 2011

XII - O Enforcado



No meu tornezelo, amarrada está a corda vermelha. Não vou longe. Quando penso demais em vôos e voltas, a corda fica tesa e me derruba de pronto. No tornozelo direito, tudo que há de racional em mim, todas as coisas concretas, as contas, as canetas, os livros comprados, os textos empacotados, os sentimentos guardados, tudo amarrado na outra ponta da corda.

Às vezes tento roer a corda, esfiapo alguns centímetros, encho meus caninos de fibras vermelhas. Em vão. Eu mesmo remendo a corda depois, reforço, dou mais um nó, prendo bem, testo a distância e a encurto mais.

E se não há corda suficiente, corto as pontas das asas, como fazem com os pássaros verdes. Ou arranco minhas penas de cera - as mesmas que me impedem de chegar junto ao Sol.

Sou todo refém de mim e de minhas próprias armadilhas. Traço planos de liberdade à noite e reforço a segurança no dia seguinte. Eu me prendo porque tenho medo de onde poderia chegar caso fosse livre demais. Medo da loucura de me encontrar ao extremo. Medo de gostar da insanidade. Medo de realizar meu sonho de infância: o hospício.

Nestes medos eu penso que me prendo para minha própria segurança. E no fim não é. Eu me prendo pela comodidade, pela preservação da espécie, pela imobilidade que só tem aquilo que se prende. Para evitar os arranhões, as marcas, as cicatrizes.

E me prendo também para poder sonhar ao invés de viver, pra poder cantar e ter alguém para ouvir. De besta, me prendo de besta mesmo. E sei que estou assim, sei que estou errado, sei que queria muito mais do que minha cordinha vermelha. Mas não sei onde encontrar coragem para prosseguir. Não sei onde encontrar tesoura afiada o suficiente para eu não me arrepender. Não sei onde me desencontrar. Perdão, não sei.

2 comentários:

  1. Acredito que não se separa o corpo da alma, não há corda para ser cortada. Somos ambas as coisas.

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