segunda-feira, 19 de setembro de 2011

E chove em Tapera VI

— Se ele não parar de tocar isso, vou tacar uma pedra naquela janela.
— Não vai nada. Pára com isso. A música nem é ruim.
— Eu sei. E não é esse o problema.
— E qual é o problema então?
— O problema é que desde antes de vir eu estava me preparando. Me preparando pra não estender essa mão aqui, pra não tocar tua pele, pra não sentir o calor, pra não chegar mais perto...
— Pára.
— Não. Deixa eu falar. A distância às vezes é foda demais. E a distância entre nós é de alguns centímetros só e, mesmo assim, eu precisaria passar abismos pra poder ultrapassá-la. E essa música. Esse é o problema. Ela está me dando asas. Ela está me dando motivo, coragem, coragem de pular o abismo. De chegar meu rosto mais perto do teu. De tocar teu pescoço com a minha boca. De deslizar, de te beijar. Que droga. Eu não queria ter dito nada disso. Eu só queria ter dito que vou sentir sua falta agora que você se vai. E depois eu queria ter ido embora, chorando na chuva pra que ninguém visse ou risse. E agora estou falando sem parar. E a música vai começar de novo. E eu não sei o que fazer.


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