Ela costuma dizer que eu sou inteligente e racional, mas que de repente despenco. Verdade. É que às vezes eu sinto uma felicidade enorme em acreditar nas coisas bobas. E em ser simples e fútil e gente. Meu Deus, sou quase comum.
Uma de minhas fraquezas, por exemplo, é o Tarot. Pensem só, um homem mestrando, que de tão sério até óculos usa, acredita nas bobagens das cartas. Confesso envergonhado, mas também explico: é que de muito cedo fui fascinado. Aos sete anos gastei meu dinheiro de comprar carrinhos em um baralho barato. Cresci com ele nas mãos, decifrando e inventando para as figuras significados surreais.
Aprendi a ler a sorte de menino, quase por pura inspiração. E nenhuma vez me foi dado o benefício de errar. É que por coincidência ou estruturação empírica, minhas previsões jamais falharam. Antes, porém, que fechem esta janela a me pensar crédulo demais, eu aviso: já nem leio a sorte. E, mesmo no tempo em que muito lia, sempre fui cético. Um cético fascinado, mas um cético. E como não se fascinar pelo mistério? Por mexer no caldeirão do encoberto?
Em alguns círculos, o Tarot é conhecido como “O Livro das Páginas Flutuantes”. E, de fato, o baralho todo descreve muitas histórias. Há uma dos arcanos maiores, 22 cartas cheias de mistérios elevados. O Louco (coringa de um baralho comum) passa pelas 21 estações, a caminho da própria formação. Essa história é a conhecida como “Jornada do Louco”.
Os 56 arcanos menores também contam histórias sublimes. E o sentido de livro aí está: o Tarot contém todas as experiências humanas (genéricas) possíveis. Cada lâmina seria, assim, uma página. Ao fazer uma tiragem (ou uma “leitura” – não de todo por coincidência) as páginas seriam organizadas de forma a melhor contar a vida do consulente.
Vocês percebem que meu deslumbre pelas cartas não é de todo tolo? Se elas divisam o futuro eu não sei. Mas que possuem uma simbologia riquíssima não haverá de ser negado. Afora isso, os baralhos de Tarot são lindos. Eles me representam um turbilhão de arte. Desde aqueles monocromáticos aos mais modernos, eu fico sempre em êxtase.
Há edições das mais diversas (cliquem nas palavras vermelhas para terem uma idéia): baralhos que, por exemplo, associam-se à mitologia e às antigas tragédias gregas. Outros que tomam suas representações nos contos de fadas. Há cartas com anjos, silfos, orixás... Há lâminas eróticas, clássicas e outras com aquarelas simplesmente surreais...
Não sou tarólogo, nem de longe. Mas sou um amante colecionador de cartas. Por que isso hoje? Porque acabo de comprar mais um baralho. Este me pescou completamente por sua beleza. Há em cada desenho um traço que me lembra infinitamente dos meus livros de criança. É delicioso espalhar-se admirando as cores e decifrando o intrincado código de símbolos presente em cada um dos 78 arcanos. Eu ouço estes personagens sussurrando histórias que quem sabe um dia venho contar.
Nem que eu explicasse durante anos eu seria capaz de fiar tudo que esta arte pagã me representa. Tolo, crédulo e parvo. Usem o adjetivo que lhes servir. Eu agora estou ocupado demais para ouvir. Só as histórias deste outro livro é que me interessam.
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PS: As cartas que ilustram esta postagem pertencem ao baralho pintado pela artista canadense Paulina Cassidy.
Tem como não gostar?
ResponderExcluirTem como negar que é todo um tipo de arte peculiar e fascinante (independente de crenças...)?
Eu não vejo como.
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Reforçando o de sempre... Quem quiser ler e comentar meu texto candidato à publicação na Revista Ficções, o endereço é:
http://revistaficcoes.com.br/conto.php?cod=629
Grato.
Olá, demorei mas apareci. Fico feliz que tenho gostado do meu texto!
ResponderExcluirQuanto ao tarot, não entendo muito. Meu contato com isso é pelo cineasta e tarólogo Alejandro Jodorowsky, ele tem até um curta sobre o tarot de marselha, assim como seu filme A Montanha Sagrada, que usa o tarot para alguns simbolismos... se vc se interessa por isso devia procurar pra ver.
Abraço